ANÁLISE DOS ENREDOS 2017 – IMPERATRIZ LEOPOLDINENSE

Escrito por Carlos Eduardo Dantas.

“XINGU, O CLAMOR QUE VEM DA FLORESTA”



A GRESIL do bom carnavalesco Cahe Rodrigues trás mais uma vez um enredo indígena para avenida. E não há nada de novo. Matança de índio, desmatamento da floresta, expedições do “homem branco”, rouco de terras. Tudo que já passou tantas vezes que fica quase impossível lembrar todas. Esperava ao menos um algo a mais, mas infelizmente não existe.

"O índio estacionou no tempo e no espaço. O mesmo arco que faz hoje, seus antepassados faziam há mil anos. Se pararam nesse sentido, evoluíram quanto ao comportamento do homem dentro da sociedade. O índio em sua comunidade tem um lugar estável e tranquilo. É totalmente livre, sem precisar dar satisfações de seus atos a quem quer que seja. Toda a estabilidade social, toda a coesão, está assentada num mundo mítico. Que diferença enorme entre as duas humanidades! Uma tranquila, onde o homem é dono de todos os seus atos. Outra, uma sociedade em convulsão, onde é preciso um aparato, um sistema repressivo para poder manter a ordem e a paz". 
(Orlando Villas-Bôas, sertanista
            A sinopse começa com um texto de talvez o maior sertanista do Brasil, Orlando Villas-Bôas, que descreve um pouco do comportamento indígena, onde mora e etc. O texto já mostra o qual enfadonho será o enredo que virá pela frente. “Senta que lá vem a história”.
Introdução

– Hoje, não vamos falar apenas de lendas, nem alimentar mistérios que dependem de nossa imaginação. Você cresceu, guerreiro menino, não é mais um curumim. Teve coragem para enfrentar as tucandeiras, traz no rosto as marcas do gavião e já consegue enxergar além das curvas do caminho. Hoje, vamos falar da verdade. É preciso entender o passado para saber o que nos aguardar no futuro. 
Quando seus pés tocarem o chão, pise com a certeza de quem ninguém ama tanto esta terra como a nossa gente. Somos o povo da floresta. Os espíritos de nossos ancestrais dormem nos troncos das árvores. O amanhã resiste em cada semente carregada pela força do destino, conduzida pelos pássaros que enfeitam nossos cocares, orientam nossas flechas e repovoam essa gigantesca floresta. Nós somos a floresta e deixaremos que o vento leve este canto aos homens de boa vontade. Eles precisam nos ouvir. 
Sim, guerreiro menino, porque quando não existir mais floresta, nossa gente será apenas lembrança e o que eles chamam de país, já não terá nenhuma esperança…
            A introdução do enredo te deixa com uma esperança: “Não viemos falar apenas de lendas...” PERCA TOTALMENTE AS SUAS ESPERANÇAS. Repito, não há nada de novo. Aqui percebemos que é mais um enredo narrado em primeira pessoa. Um índio falando com outro índio. Até ai tudo bem, mão fosse o fato do enredo ter forte influencia dos livros de Orlando. Oras... Confuso, não?
CELEBRAÇÃO TRIBAL

– Nossos irmãos vêm de canoa, dos lugares mais distantes da floresta. Fazem uma roda no centro da aldeia. Corpos pintados, iluminados pela lua cheia. É noite de festa.  Vamos dançar ao redor da fogueira. Mavutsinim, o Criador, nos chamou para celebrar a paz e o amor. Tambores, flautas e maracás tocarão a noite inteira. E quando o dia clarear, nossa alma despertará: formosa, cabocla, guerreira… Verdadeiramente brasileira!
Devemos encarar a vida com simplicidade. A terra aquecida pelo Sol é a mesma que a Lua protege com o véu da noite, guardando as surpresas para o novo dia. Sonhos existem, mas o destino somos nós que traçamos: colhemos o que plantamos. A morte faz parte da vida. Ela é o resultado de nossas experiências. É a colheita de nossa existência. Ao guardar os espíritos de nossos antepassados em troncos sagrados, criamos uma ponte para a eternidade, No Kuarup, o que era mito, vira realidade. Celebramos essa derradeira viagem com muita alegria, festejando a certeza de que raros são os que partem com tamanha serenidade – servindo de exemplo para os seus e a comunidade. Cantamos e dançamos, orgulhosos do nosso jeito de fazer parte da Humanidade.
            Se não bastasse todo o clichê, a sinopse é dividida por títulos que descreve a história que virá. Como se precisasse... Começamos com algo “que nunca foi visto na história dessa país” um Ritual Indígena. Temos a descrição do ato e quase é possível sentir a magia, Ponto pra Cahê que consegue transmitir isso através de um texto. Algo de bom pode sair desse começo. A Gresil tem tudo para fazer uma grande CF, muito melhor que os medonhos “Power Rangers” do último ano (Saudades Fábio de Melo).
O PARAÍSO ERA AQUI

– Amamos esta terra muito antes de ela se chamar Brasil. Desde o tempo em que não havia fronteiras. Era céu e chão, até onde os olhos pudessem alcançar, percorrendo serras, florestas, rios, cachoeiras… Sobre o ventre da Natureza, Tupã estendia o seu manto. Como por um encanto, do lago surgia um pássaro sagrado, protegendo a nação Kamayurá, fazendo a vida brotar… intensa, pujante, vibrante, com uma infinidade de cores. Nuvens de borboletas enfeitavam as flores. Pirarucus, tambaquis e tucunarés povoavam os igarapés. Aranhas tecelãs bordavam suas teias, pirilampos faiscavam na aldeia. Do alto dos buritis, ecoava uma sinfonia. Cigarra cantava, acompanhando um coral de aves. O som grave dos bugios e o esturro da suçuarana alertavam para um risco permanente à nossa frente. Quem vem lá? Kayapó ou Kalapalo? Tatu ou tamanduá? Assim era a nossa floresta, casa de nossa gente. Não foi por acaso que, quando o caraíba aqui chegou, imaginou estar no Paraíso – um Jardim Sagrado, de onde o próprio Deus dele o expulsou.
            O Índio descreve sua terra. Puxa na memória fatos de sua gente. Deixa explicito que são os donos da terra antes mesmo dela ganhar um nome. Existe uma bela descrição da terra, o que poderá render uma boa estética. Mas aqui me surge uma dúvida... Conceitualmente falando, não seria mais coerente conhecer primeiro a terra e ai sim os rituais? Talvez não seja nada demais, mas isso me deixou incomodado. Uma lenda sobre um pássaro, sobre aranhas, sobre a terra... Esse trecho termina com uma boa citação a chegada dos portugueses e suas culturas.
O “ABRAÇO” DA SUCURI

– Se perderam o seu Paraíso, os caraíbas partiram para conquistar o nosso, pequeno  guerreiro – talvez, por vingança de Anhangá, o feiticeiro. Impulsionadas pelos ventos da cobiça, as naus aportaram em nossas praias, trazendo ensinamentos que os invasores nunca ousaram praticar. Nada mais seria como antes. Em vez de nos tratar como semelhantes, nos chamaram de selvagens e tentaram nos escravizar. Vinham do Velho Mundo e representavam a civilização. Chegaram arrogantes, se apoderando de nossas terras e riquezas. Levaram ouro, prata e diamantes, e uma madeira que tingia com sangue, lembranças de tantas belezas. Em troca, traziam espelhos, doenças e destruição. Sua missão era usar a cruz de um Deus que morava no céu, fincando marcos aqui e ali; usando palavras sagradas, deixaram nossa gente esmagada, como no abraço lento e mortal da sucuri.
            Um doce pra quem acertar quantas vezes essa cena já foi escrita, descrita e mostrada. Chegam os portugueses com sua cobiça, mudam toda uma gente, e etc... É tanto clichê que não dá nem pra se alongar. Não tem nem o que explicar. A proposto, mais uma lenda é citada.
BELOS MONSTROS

– Caraíba não mede consequências. Acredita na sua ciência, buscando o que chama de progresso. Derruba floresta, espalha veneno e acha o mundo pequeno para semear tanta arrogância. Invade nossas terras, liga a motosserra e no lugar dos troncos sagrados, planta ganância. Caraíba precisa de mais energia para alimentar os seus interesses. Cria verdadeiros monstros. Belos monstros… usinas que devoram rios, matam peixes, secam nascentes, inundam tabas e arrastam na lama o futuro de nossa gente. Não podemos deixar, guerreiro menino, que afoguem o nosso destino. Nossa casa é aqui! E não devemos nos curvar. Precisamos honrar cada dente do colar, cada palavra do irmão Raoni!
            Talvez a única coisa atual do enredo é citada aqui, mas até isso foi posto em forma de clichê. A polêmica Usina de Belo Monte é veladamente criticada nesse setor. Setor este que despertou a critica de outro setor... O do agronegócio que se doeu e já fez severas críticas ao enredo. Fico curioso para saber como isso será mostrado no desfile.
CACIQUES BRANCOS

– Também é justo lembrar de caraíbas que foram amigos. Eles se embrenharam pelo sertão para fazer do Brasil uma grande nação, criando picadas, abrindo estradas e campos de pouso para a aviação. Foram os primeiros a escrever nessas terras a palavra integração. Eles ficaram encantados com o nosso jeito de ser. Não conseguiam entender que para respeitar e ser respeitado, nenhum de nós precisa vigiar ou ser vigiado. Responsabilidade sempre foi um princípio honrado com a família e a comunidade. Fizemos um kuarup para saudar esses caciques brancos em nossos rituais. Eu ainda era rapaz, pequeno guerreiro, quando os vi no Roncador. Acompanhei suas expedições. Vinham em batelões, trazendo respeito e amor. Ficarão para sempre em nossos corações, protegidos por Tupã. Louvados sejam os irmãos Villas Boas, que nos ajudaram a encontrar a passagem para o Amanhã!
            Aqui a homenagem aos irmãos Villas Boas, cuja obra dá uma boa base ao enredo. Nesse setor deve passar um pouco de suas vidas e interação com os indígenas. Iremos conhecer um pouco de seu belo trabalho e legado.
O CLAMOR DA FLORESTA

– As nações xinguanas se reúnem para celebrar o orgulho de ser índio e pedem licença para falar: Enquanto o caraíba não recuperar o seu equilíbrio, a Natureza agonizará. E sem ela, sem a proteção da Mãe de todos nós, estaremos ameaçados – seja na terra dos civilizados, ou nos confins dos povos isolados. Já é tempo de o caraíba cultivar a humildade e aprender com o índio o que chama de sustentabilidade. Precisa esquecer os lucros, o progresso, o consumo e o desenvolvimento; zelar pelos sentimentos e os compromissos com a Humanidade, retirando da Natureza apenas o que basta para o seu sustento.
Jovem guerreiro, voe nas asas do vento e espalhe estas palavras de Norte a Sul. Os povos não-índios precisam entender que é chegado o momento de ouvir o clamor do Xingu!
            E não poderia terminar de outra forma se não com o “clamor” e o pedido de socorro. Espero uma boa estética da escola de Ramos, porque acredito que o enredo será algo potencialmente devastador, com o perdão do trocadilho. Não teve nem muito o que dizer... Tá tudo ai.
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