ANÁLISE DOS SAMBAS 2017 – MOCIDADE
Escrito por Hyder Oliveira.
A Mocidade vai nos levar a uma
viagem “pra lá de Marrakesh” com um enredo sobre o Marrocos. País com uma
cultura rica, que contém cidades muito importantes, como Rabat – a capital;
Casablanca – cidade mais importante e célebre pelo filme homônimo; Fès – cidade
onde foi filmada boa parte da novela “O Clone”; além de Marrakesh, conhecida pelos
contos dos tapetes voadores e que será a sede principal do enredo. Entre
cultura, gastronomia, mitos, desertos, músicas, encantos e magia, o país do
noroeste africano rendeu um samba que caiu no gosto do povo, sobretudo pela
atuação magistral do extraordinário Wander Pires. Um samba grande, mas
divertido e muito bem interpretado, que vamos analisar a partir de agora.
BRILHA O CRUZEIRO DO SUL DO ORIENTE DE ALAH
CÉU DE SHERAZADE
VEM PRA MARROCOS, MEU BEM
VEM MINHA VILA VINTÉM
SONHA MOCIDADE
CÉU DE SHERAZADE
VEM PRA MARROCOS, MEU BEM
VEM MINHA VILA VINTÉM
SONHA MOCIDADE
O refrão principal é uma sacada interessante ao comparar o
símbolo da escola (estrela-guia) com o céu do outro lado do mundo. Há uma
pequena falha geográfica, pois o Marrocos faz parte do Ocidente, mesmo que a
sua religião predominante seja o islamismo, muito comum em países do Oriente
Médio. Peca bastante em criatividade, mas apresenta de forma digna o que será
abordado no enredo.
FUI NO DESERTO RONCAR MEU TAMBOR
PRA ALAH CONHECER MEU XANGÔ
DE REPENTE A MIRAGEM APARECE
NA PRAÇA, UM SENHOR, CONTANDO HISTÓRIAS DE AMOR
EU FUI PRA LÁ DE MARRAKESH
MINHA ZONA OESTE COMOVIDA DE PAIXÃO
ÉS MINHA “EL JADIDA”, MEU TEATRO DE ILUSÃO
TANTO ASSIM QUE O MEU OLHAR
VÊ NO MAR DE GIBRALTAR, SEREIAS
DAMA DAS AREIAS DE IEMANJÁ
TEU DESERTO, MEUS SERTÕES
BEDUÍNOS, LAMPIÕES… “VADEIA”
MISTURA ALAÚDE COM GANZÁ
PRA ALAH CONHECER MEU XANGÔ
DE REPENTE A MIRAGEM APARECE
NA PRAÇA, UM SENHOR, CONTANDO HISTÓRIAS DE AMOR
EU FUI PRA LÁ DE MARRAKESH
MINHA ZONA OESTE COMOVIDA DE PAIXÃO
ÉS MINHA “EL JADIDA”, MEU TEATRO DE ILUSÃO
TANTO ASSIM QUE O MEU OLHAR
VÊ NO MAR DE GIBRALTAR, SEREIAS
DAMA DAS AREIAS DE IEMANJÁ
TEU DESERTO, MEUS SERTÕES
BEDUÍNOS, LAMPIÕES… “VADEIA”
MISTURA ALAÚDE COM GANZÁ
Na primeira estrofe já podemos perceber de forma muito claro
o ponto negativo do samba: a completa desconexão com a sinopse. Além de
misturar diversos setores, acrescenta informações que nem sequer estão
presentes no enredo, o que pode ser visto como um erro muito grave. Não há um
nexo entre os versos, o que aparenta ser apenas uma tentativa de construir uma
melodia com os pontos presentes no Marrocos, o que resulta em uma enorme
confusão. Começa falando sobre a ida ao deserto roncar o tambor para Allah
conhecer o xangô da escola (informação que não se encontra em momento algum da sinopse,
mas vamos presumir que ele quis ressaltar isso), logo em seguida aborda que uma
miragem aparece. Qual? Na sinopse fala que é um reino mágico; já o samba muda
de forma inexplicável para falar de um senhor contador de histórias de amor –
algo mencionado apenas no setor seguinte, ao falar de Sherazade e dos
encantadores de serpentes. Segue exaltando o seu pavilhão, fazendo uma
comparação estranha com a cidade de “El Jadida”, que foi arrasada pelos
portugueses no século XVIII sob a ordem do primeiro-ministro Marquês de Pombal.
Logo em seguida, o samba volta um setor para mais uma contradição. A sinopse
fala de sereias no Oceano Atlântico e o samba fala do mar de Gibraltar. O
encerramento da estrofe é uma comparação entre instrumentos marroquinos com
brasileiros, de uma maneira bastante forçada. Estrofe muito pobre, diga-se de
passagem.
ABRE-TE SÉSAMO QUE O SAMBA ORDENOU
MIL E UMA NOITES DE AMOR
PÕE ALLADIN NO AGOGÔ, TANTAN NA MÃO DE SIMBAD
MEU OUVIDO É DE MERCADOR
MIL E UMA NOITES DE AMOR
PÕE ALLADIN NO AGOGÔ, TANTAN NA MÃO DE SIMBAD
MEU OUVIDO É DE MERCADOR
ABRE-TE SÉSAMO QUE O SAMBA ORDENOU
MIL E UMA NOITES DE AMOR
É O SAARA DE LÁ COM O SAARA DE CÁ
MINHA MOCIDADE CHEGOU…
MIL E UMA NOITES DE AMOR
É O SAARA DE LÁ COM O SAARA DE CÁ
MINHA MOCIDADE CHEGOU…
Melhor parte do samba, indiscutivelmente. O trecho, que pode
ser considerado como um refrão do meio, faz um paralelo dos contos do Oriente
Médio, baseado no livro “As mil e uma noites”, com o samba brasileiro. Ali Babá
e Sinbad, protagonistas dessas histórias, não são marroquinos, viviam entre o
Sudão e a Mesopotâmia. Outro ponto bem discutível para o que o enredo pretende
mostrar. A boa sacada é em relação ao “ouvido de mercador”, expressão muito
utilizada aqui no Brasil para demonstrar que a pessoa finge não escutar quando
alguém se dirige a ela, destacando a profissão do aventureiro Sinbad e do chefe
dos ladrões que tentava matar Ali Babá, que fingiu ser um mercador para conquistar
a confiança do lenhador. Além disso, a ligação entre o Saara (deserto africano)
com o Saara carioca (comércio popular) é bastante interessante. Wander Pires
deu um show particular e faz dessas estrofes um momento extremamente agradável
de se ouvir no samba.
CHEGOU… CHEGOU…
DE PADRE MIGUEL, A CANDEIA
A CARAVANA DE ALÉM-MAR RETORNA A NOSSA ALDEIA
ÓH MEU BRASIL, ABRACE A HUMANIDADE
ÉS A PÁTRIA MÃE GENTIL DA AMIZADE
A CARAVANA DE ALÉM-MAR RETORNA A NOSSA ALDEIA
ÓH MEU BRASIL, ABRACE A HUMANIDADE
ÉS A PÁTRIA MÃE GENTIL DA AMIZADE
Trecho final que não tem ligação alguma com a sinopse. O
samba tem uma considerável queda de intensidade melódica, sendo uma introdução
bastante limitada ao refrão. De uma forma geral, o compositor ressalta o fim da
viagem e o retorno ao Brasil, com um apelo à valorização das diferenças entre
os povos, ressaltando o valor de nossa cultura, depois de conhecer um pouco de
outros povos, com seus credos e costumes.
O samba da Mocidade Independente de Padre Miguel para o
carnaval de 2017 tem algumas nuances interessantes. Se por um lado, a melodia
cai no gosto popular por ser altamente animada e muito bem interpretada, a
letra contém diversos deslizes, como falhas geográficas e históricas, mistura
de setorizações e até mesmo presença de alguns dados não mencionados na
sinopse. Vamos ver como os jurados irão avaliar esses aspectos. Boa sorte e que
a estrela-guia de Padre Miguel possa voltar a brilhar como nos seus melhores
dias.
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