SINOPSE DO ENREDO - G.R.E.S. ACADÊMICOS DE VENDA NOVA


O Grêmio Recreativo Escola de Samba Acadêmicos de Venda Nova, orgulhosamente, apresenta o enredo para o seu desfile de 2016, intitulado: “Uai, Venda Nova manda queijos e beijos procês!”. Neste 12º carnaval, a nossa Escola de Samba trará mais um enredo inédito, apresentado com muita originalidade e criatividade.

Da mesa mineira para o mundo, os queijos produzidos em Minas Gerais fazem parte da nossa cultura e costumes. Quem não se lembra do queijo quente que a vovó assava no fogão? “– hummm”. E do cheirinho da gostosura, ingrediente de muitas receitas? “- Bom demais da conta, sô!!!” Porém, poucos conhecem a história dessa apreciada iguaria l’áctea, adorada pelos mineiros, que remonta há mais de 8 mil anos antes de Cristo. Neste carnaval de 2016, a Acadêmicos de Venda Nova deliciará o público com um banquete servido de muito samba, alegria, fantasia e, é claro, com o delicioso queijinho mineiro.

Leite, dádiva da natureza, matéria-prima do queijo

Generosa é a natureza que nos fornece este importante alimento que é o leite de origem animal, seja da vaca, cabra, búfala, égua, jumenta e ovelha, dentre outros mamíferos. Essa verdadeira seiva da vida, há milhares de anos, alimenta tanto os seus filhotes quanto o ser humano. Intuitivamente nos habituamos com essa bebida, que é uma das mais importantes fontes de água, minerais e gorduras, necessários ao nosso crescimento e saciedade, vitais à manutenção da vida saudável. Do seu processamento adquire-se o queijo, tema do nosso enredo. Esse alimento é um derivado do leite concentrado, obtido através da coagulação e da eliminação da parte líquida (soro). Há variedades dessa iguaria que recebem temperos e complementos diversos.

Segundo a lenda, foi o grego Aristeu, rei de Arcádia e filho dos deuses Apolo e Cirene, quem criou o queijo, conhecido na antiguidade como o “alimento dos deuses”. Era apreciado tanto nos rituais religiosos, quanto nas festividades populares e eventos palacianos. Em terras gregas e romanas o queijo fazia parte da ração diária da sua população e guerreiros. Há também uma lenda que atribui a um nômade árabe esta descoberta que, numa das suas jornadas pelo deserto, levou tâmaras secas e um pouco de leite armazenado numa bolsa feita de estômago de carneiro, para o seu sustento. Com o passar do tempo, o leite se solidificou e, para a sua surpresa, ao prová-lo, percebeu a sua consistência e sabor agradáveis.

O queijo é um bom complemento alimentar. É valioso por ser de fácil transporte, ter longa durabilidade e alto teor de gordura, proteína, cálcio e fósforo. O queijo é uma forma mais compacta de nutrição e tem uma validade mais longa que a do próprio leite, do qual ele é feito. Assim, sob a forma de queijo, a humanidade conseguiu preservar o leite por mais tempo e garantir muitos dos seus prazeres e propriedades alimentícias.

O Queijo na história da humanidade

Há estudos arqueológicos que revelam o consumo de leite solidificado, datados de 7.000 anos a.C. Há outros achados que revelam a existência de queijos feitos a partir de leite de vaca e de cabra, há 6.000 anos a.C. Propor uma data para a sua origem pode variar desde aproximadamente 8.000 a.C., quando as ovelhas foram domesticadas na região do Oriente Médio. Também, atribuir a uma determinada localidade a descoberta do queijo pode ser impreciso, dado às diferentes fontes de leite animal disponíveis e utilizados, inclusive leite de iaques - nas estepes asiáticas, das camelas - na Arábia e África. Porém, nas América e Oceania, não há evidências que comprovem a produção de queijo antes da chegada dos colonizadores europeus.

África – Conhecidos criadores de gado, os egípcios estão entre os primeiros povos que o domesticaram, obtendo no leite e no queijo, uma fonte importante de alimentação. O fértil vale do rio Nilo possuía vastas áreas de pastagens naturais, cheias de gado. O bovino era tão importante na cultura do antigo Egito, que dos seus chifres compuseram a coroa da deusa Hator (pronuncia-se rátor), divindade da fertilidade, do amor e das artes. Queijos feitos de leite de vaca, de cabra e de ovelha também foram encontrados nas tumbas e nos murais, que mostram cenas de sua fabricação. Estudos indicam que, provavelmente, os primeiros queijos tenham sido muito salgados e ácidos, similares em textura ao rústico queijo cottage ou feta, um farelento e saboroso queijo grego.




Europa - Os gregos foram os primeiros a adotá-lo na alimentação, feito exclusivamente com o leite das cabras e ovelhas. No entanto, foram os romanos os responsáveis pela disseminação da cultura do queijo pelo mundo. O grande império romano recebia tipos diferentes trazidos das mais variadas regiões. De simples alimento, alçaram o queijo à categoria de iguaria apreciadíssima e indispensável nas refeições dos nobres e em grandes banquetes imperiais. Os romanos apreciavam o queijo, do qual fabricavam inúmeras variedades e cujas virtudes conheciam, pois o utilizavam na alimentação dos soldados e atletas. Passagens bíblicas registram o queijo como um dos alimentos fundamentais da época. A obra escrita De Re Rustica (sobre as coisas do campo), de Columella (cerca do ano 65), descreve um processo de produção de queijo utilizando a coagulação do leite pelo coalho, separação do soro, salga e maturação. A Naturalis Historia (cerca do ano 77), de Plínio, dedica um capítulo (XI, 97) para descrever a diversidade de queijos consumidos pelos romanos do início do império.

Ásia – Em achados recentes, peças foram descobertas no complexo Tumbas de Xiaohe (na China) e constatou-se serem blocos de queijo, datadas de 1.650 anos a.C. O queijo da província chinesa de Yunnan é secularmente produzido por várias minorias de grupos étnicos, com a adição de água e vinagre de arroz ao leite de búfala. Com uma relação profunda com a mitologia e as divindades, o leite e o queijo tiveram maior abrangência na antiga Suméria, passando pelas civilizações babilônica e hebraica. O queijo produzido a partir do leite de dri ou nak (fêmea do iaque), é comum nas regiões do Himalaia, Ásia Central, Tibete e Mongólia. O prato nacional do Butão, ema-datsi, é feito a partir do queijo chhurpi, caseiro e apimentado.

A partir da Idade Média, a fabricação de queijos finos, ficaria restrita aos mosteiros católicos, com novas receitas desenvolvidas por seus monges. Com o advento das feiras e mercados nos séculos XIV e XV, algumas queijarias de regiões remotas ficaram mais visadas. No século XIX aconteceu um significativo aumento no consumo do queijo, afinal, a sua produção que era artesanal passou para a ordem industrial, utilizando-se dos processos de pasteurização. Foi na Suíça, em 1815, que ocorreu a instalação da primeira fábrica que produziu o queijo industrialmente.

O clima mais frio que do Oriente Médio exige uma menor quantidade de sal para a sua preservação. Nas condições de menor quantidade de sal e acidez, o queijo torna-se um ambiente propício para uma grande variedade de micróbios benéficos e mofos, que são os responsáveis pelos sabores peculiares e apreciadíssimos dos queijos mais velhos. No final da Idade Média, ou depois dela, é que muitos das variedades conhecidas foram registrados, como o inglês cheddar (por volta de 1500), o italiano parmesão (1597), o holandês golda (1697) e o francês camembert (1791).

“Trem-bão é o queijim mineiro”

Contando com cerca de 40% do rebanho em seu território, Minas Gerais possui a maior concentração nacional de gado. A descoberta do ouro no sertão das Gerais em 1693, pelo bandeirante paulista Antônio Rodrigues Arzão, deu a partida para o novo vetor de colonização, exploração e avançamento, a partir de 1698. Em 1729, com a descoberta de diamantes no Arraial do Tijuco, atual Diamantina, uma nova leva de exploradores adensa ainda mais a população aqui no interior do Brasil. Dos 6 mil habitantes em 1700, passou a contar com cerca de 270 mil em 1742.

Aqui o gado foi introduzido para o abastecimento, dado o repentino e crescente aumento populacional, rompendo e vencendo montanhas pelos tropeiros que vinham do litoral e de outras regiões, até o coração das Minas. O queijo português, da Serra da Estrela, veio nessa bagagem, sendo o precursor do nosso queijo do serro, atual Serro. O queijo minas ou queijo de Minas, também surgiu por esses caminhos. É um queijo de pouca "cura" e agradou ao paladar da população e da coroa, instalada no Rio de Janeiro.


No sul mineiro, na Serra da Mantiqueira, a introdução do gado leiteiro holandês, foi propiciada pelo clima ameno, pelas áreas de pastagem natural composta principalmente de capim gordura e uma flora láctea naturalmente presente. Surgiram na região o queijo prato e o queijo do reino, sendo esse último ainda hoje muito consumido no Nordeste brasileiro, principalmente nas épocas das festas de São João e Natal. Foram os dinamarqueses e holandeses que instalaram as primeiras manufaturas de derivados do leite em Minas.

Minas Gerais está a cada dia se consolidando mais no roteiro mundial das queijarias de excelência. Em 2015, um feito inédito chamou a atenção para a região da Serra da Canastra, no sudoeste mineiro. Um queijo produzido na região, na fazenda Estância Capim Canastra, ganhou a medalha de prata numa competição. A competição Mondial du Fromage de Tours foi realizada na França e avaliou mais de 600 tipos de queijo de 23 países. A categoria vencida pelo queijo mineiro foi a de massa prensada não cozida de leite cru de vaca.

O tradicional alimento do estado não perde em nada para os mais aprimorados queijos importados. Seja o canastra, o serro, o frescal, o meia-cura, o minas, o de coalho, o do reino, enfim, são tantas as opções, que fica até difícil dizer qual é o mais apreciado. Essa iguaria faz tanto sucesso que já virou Patrimônio Cultural Brasileiro e Patrimônio Imaterial de Minas Gerais, títulos estes que reconhecem o modo típico de preparo dos queijos artesanais da região do Serro e da Serra da Canastra.

Quem mexeu no SEU queijo?

O queijo é nosso, é patrimônio, é identidade do mineiro. Nossa cultura o elegeu como o rei da mesa. Versátil que é, pode ser apreciado e servido tanto em estado natural quanto em misturas elaboradas. Está presente nas “mesas de café”, pratos principais, acompanhamentos, conservas e até nas sobremesas. Forma dupla imbatível com os doces de leite, goiabada e frutas em calda, mais que populares por aqui.

Bom, também, é apreciar as delícias preparadas com queijos na cozinha mineira. De lá, vem o cheirinho das iguarias preparadas nos fogões-a-lenha, em tachos-de-cobre, ao calor das chamas bruxuleantes. A receita é mineira, “queijo + ovos + fubá + qualhada + erva-doce + açúcar + pitada de sal”, mistura-se tudo, unta-se uma forma com manteiga, despeja-se o caldo precioso e deixe-o assar. Passou um tempinho e a vovó retira do forno uma morena broa-de-fuba, corta-a em pedaços e serve aos netinhos, acompanhado um cafezinho “passado agorinha”.

A comadre, que “de boba não tem nada”, ao perceber o burburinho na cozinha vizinha e os cheirinhos emanados das delícias, apressa-se de retirar do forno um tabuleiro com pães-de-queijo, com a casquinha ainda crocante, assados ainda na “horinha”. A mineirice receita, “goma + queijo meia cura ralado + leite para escaldar + ovos + manteiga + sal”, foi se espalhando por todo o país e se tornou popular a partir da década de 50, hoje, países como Estados Unidos, Portugal, Itália e Japão importam os deliciosos pães de queijo. É tudo “bão demais da conta, sô!”. É queijo, é festa, é Minas Gerais.

Mas, afinal, quem mexeu no SEU queijo? A Acadêmicos de Venda Nova inspirou-se na clássica obra motivacional, do escritor inglês Spencer Johnson, do original “Who moved my cheese?”, para encerrar o seu desfile. É uma parábola com dois ratinhos e dois homenzinhos que viviam em um labirinto em busca de queijo, em alusão ao que se deseja ter na vida e das dificuldades encontradas. E, quais ratos são esses que estão comendo o seu quinhão do queijo? E que atrasa o desenvolvimento e o crescimento pessoalmente e em sociedade? É a metáfora da política nacional.

E para encerrar...

“Uai, Venda Nova manda queijos e beijos procês!”



Belo Horizonte. Agosto de 2015.
Diretoria Artística e Cultural

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