ANÁLISE DOS SAMBAS 2017 – VILA ISABEL

ANÁLISE DOS SAMBAS 2017 – VILA ISABEL 

Escrito por Hyder Oliveira.



O som da cor. Antes de qualquer coisa, é preciso ressaltar a força do enredo, que retrata com maestria a influência da música em cada sociedade e a contribuição de diversas culturas para a difusão das danças e da musicalidade. A pesquisa apurada de Alex de Souza rende um samba virtuoso, que cai como uma luva na voz do talentoso Igor Sorriso.

ÔÔ Kizomba é a Vila
Firma o batuque no som da cor
Valeu Zumbi, a lua no céu
É a mesma de Luanda e da Vila Isabel


Cheirinho de déja vu. Kizomba, Zumbi, Vila Isabel, Martinho, Luanda... É indiscutível a importância do marcante “Kizomba, a festa da raça”, de 1988, na história da escola do bairro de Noël, considerado por muitos o melhor desfile de todos os tempos (com toda a justiça, por sinal). Mas ficou um pouco forçado a presença desses termos no refrão principal, que ficou de certa forma pobre. Porém, apresenta o enredo e não compromete o andamento do belo samba.

A minha Vila chegou
Ouça essa voz
A pele arrepia ao som da batida
Força dos meus ancestrais
Herança que faz ressoar o rufar do tambor
Pra gente dançar assim, feliz
Maracas encontram tamborins
O reggae celebra mensagens de paz
Oh minha flor, quero você em meus braços
Bailando no mesmo compasso
Um tango de drama e amor

Vamos viajar! A primeira estrofe já dá o tom do samba de uma forma geral. O batuque do tambor reforça a energia musical mais simples que existe. Desde a antiguidade, o homem batucava, seja para rituais, conquistas ou até mesmo comunicação. Um instrumento acessível até mesmo aos bebês, que geralmente têm nesse hábito de bater nas coisas o primeiro contato com a melodia. A música não tem fronteiras, os instrumentos se complementam. O som das maracas caribenhas faz samba com os tamborins africanos. Se quero alegria, caio no gingado do pagode; se quero curtir um som de paz, o reggae é uma ótima pedida; se quero afogar minhas mágoas, tem a música romântica, o brega e o tango. Acima de tudo, a música é o retrato da nossa personalidade e do nosso humor.

Vila
Azul que dá o tom à minha vida
Um sopro de esperança na avenida
Eu faço um pedido em oração
Ouvi-la pra sempre no meu coração

No refrão do meio, outro cheirinho forte de dejá vu. “Vilaaaaa...” ou “viiiii láááááá...” tem se tornado um recurso muito frequente nos sambas da Vila Isabel. É uma exaltação à escola, falando da cor do pavilhão e uma menção ao enredo nos versos finais, ao falar de oração. A religiosidade, de uma forma geral, sempre contou com o auxílio de músicas próprias, como as procissões, os reisados, as pajelanças e rituais africanos. É uma sacada interessante, mas melodicamente falta alguma coisa.

Um solo de guitarra a embalar
Soul a mais perfeita forma de expressar
Eu vou, eu vou... Onde fez raiz a tradição Nagô
Eu vou, eu vou, foi
O povo do samba quem me chamou!
Ginga no lundu (morena)
Negro é o rei (é o rei)
Toque de Ijexá (afoxé)
Pra purificar (minha fé)
Gira baiana, deixa a lágrima rolar
Quando no terreiro novamente ecoa

Temos aqui a melhor parte do samba, por sua força e por apresentar, de fato, “o som da cor”. Começa falando sobre a guitarra, símbolo máximo de um ritmo musical que alcançou enorme popularidade no século XX e permanece até hoje sendo renovada diariamente: o rock. Rock de Elvis, Beatles, Rolling Stones, passando por Nirvana, Linkin Park, Metallica, Sepultura e tantos outros. Contrastando com esse ritmo mais jovem e de barulho característico, temos também a raiz do samba, ou “semba”, das raízes angolanas da “umbigada”, da tradição nagô. Com as batucadas, tia Ciata ensinou o povo a kizombar e o Brasil aperfeiçoou. Surgiram imortais, como Cartola, Noël, Nelson Cavaquinho, passando por Paulinho da Viola, Leci Brandão, Martinho da Vila, João Nogueira, Neguinho da Beija-Flor, Leci Brandão e outros mestres, que provam que o samba não tem fronteiras e o apelo feito para não deixar o samba morrer foi atendido. Afinal, “quem não gosta de samba bom sujeito não é; é ruim da cabeça ou doente do pé”.


A Vila Isabel chega para o carnaval de 2017 com um samba digno de suas tradições e com a cara do carnaval. Igor Sorriso é o melhor intérprete da nova geração e sempre dá um espetáculo. A comunidade é sempre muito forte e seguramente vai sustentar o canto ao longo de todo o desfile. O ponto fraco é a ausência de um refrão mais forte, o que pode atrapalhar um pouco o canto das arquibancadas. Mas tem uma letra sublime e tem tudo para fazer um belo trabalho na Sapucaí! Boa sorte, Vila!

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