ANÁLISE DOS SAMBAS 2017 – SALGUEIRO

ANÁLISE DOS SAMBAS 2017 – SALGUEIRO 

Escrito por Hyder Oliveira.




                           Depois de um samba extraordinário no carnaval do ano passado, a Acadêmicos do Salgueiro traz ao desfile de 2017 um samba bastante confuso, com oscilações bruscas entre as estrofes. Claro que a harmonia da escola está em grande fase e tem boas chances de passar bem na Avenida. Mas fica muito aquém de belas obras da própria agremiação. O enredo sobre a célebre obra “A Divina Comédia”, de Dante Alighieri, poderia render uma safra melhor nas eliminatórias. Vamos à análise!


VOU EMBARCAR EM ILUSÕES
À LOUCURA ME ENTREGAR
PRAZER… (Ô PRAZER)
SOU POETA DELIRANTE, O AMANTE
NA PROFANA LIBERDADE
DEVOTO DA INFERNAL FELICIDADE
QUERO O GOSTOSO VENENO DO BEIJO
SACIAR O MEU DESEJO
ME EMBRIAGAR
NOS BRAÇOS DA FOLIA ME JOGAR

Claramente, a estrofe aborda o primeiro setor do desfile da escola, que fala sobre o inferno. O hedonismo, que é a busca incessante do prazer pelo prazer, movimenta o personagem do enredo, que busca se lançar aos apetites e desejos da carne, em todos os sentidos. A prudência não existe, a vida é curta, então é o momento de aproveitar tudo que ela possa oferecer, sem medir as consequências do ato. Se tudo em excesso é veneno, o personagem não se incomoda de se envenenar de beijos, se embriagar de desejos e luxúrias. Para ele, pecado é resistir, não deixar para amanhã o que se pode fazer hoje (independente de como e onde ele acorde amanhã). É a figura clara do inconsequente beberrão que quer curtir a vida adoidado, sem se preocupar com o que os outros pensam e digam. Ele mesmo é o juiz de suas próprias atitudes.

VOU ME PERDER PRA TE ENCONTRAR
ENLOUQUECER, MORRER DE AMAR!
PRA QUE JUÍZO, AMOR? A NOITE É NOSSA…
DO JEITO QUE O PECADO GOSTA!

O refrão do meio é o melhor momento melódico do samba do Salgueiro. Diferente do refrão principal, com a repetição forçada do último verso - “Só entende quem é Salgueiro” -, os quatro versos desta estrofe estão em plena sintonia, tanto com o enredo quanto com a rima, o que causa um efeito muito agradável aos ouvidos. É uma continuação da estrofe anterior, ainda no setor do inferno, com o personagem se deixando levar pela tentação do pecado a fim de não perder a oportunidade de saciar o desejo de estar com a pessoa amada durante aquela noite.

SINTO MINH´ALMA SE PURIFICAR
VISLUMBRAR…
O PARAÍSO, NO FIRMAMENTO
TRÊS “COM SAGRADOS” TALENTOS
“VÊ, ESTÃO VOLTANDO AS FLORES…”
LÁ, ONDE RESSOAM TAMBORES
TOCA BATUQUEIRO, DOBRE O RUM
AOS PRESENTES DE ORUM…

Chega o momento de abordar os outros setores. Começa com o purgatório, estágio de purificação depois de todo o deleite na lama do pecado. Com isso, a caminhada segue com vários grupos se consolando ao afirmar que pecar pelo prazer tem a pena atenuada, afinal de contas, “cair em tentação é mais normal do que se pensa”. Mas o carnaval é essa transição para a purificação. As flores começam a surgir, o caminho se ilumina, os jardins começam a criar cor. A temperança nasce da certeza que o verdadeiro prazer é curtir o carnaval. E então os três “bambas” da história da agremiação (Arlindo, João e Pamplona), surgem como os propulsores para a salvação daqueles que cometem o grave pecado de não gostar de samba.

GIRA BAIANA E FAZ DO CÉU UM TERREIRO
TINGE ESSA AVENIDA DE VERMELHO
É NOSSA MISSÃO, CARNAVALIZAR A VIDA…
QUE É FEITA PRA SAMBAR!
DESSA PAIXÃO QUE ENCANTA O MUNDO INTEIRO
SÓ ENTENDE QUEM É SALGUEIRO…
SÓ ENTENDE QUEM É SALGUEIRO…

A parte final do samba é de gosto duvidoso. É uma clara exaltação ao pavilhão, algo característico nos sambas da Academia desde o inesquecível “Peguei um ita no norte”, de 1993. Porém, não foge completamente do enredo, pois a parte final da sinopse aborda o carnaval como o “paraíso na terra”, algo que pode soar desafiador, herético e até mesmo inovador. A “festa profana” aparece como o local do nascimento de imortais, criados na própria agremiação tijucana, tais como Arlindo Rodrigues, Fernando Pamplona e João 30. Carnavalizar a vida é transformar a tristeza em alegria, é driblar as crises em meio ao samba. Ser o maior berço de bambas... ah, isso só entende quem é Salgueiro (refrão autoexplicativo).


No geral, o Salgueiro traz um samba complexo, que mistura o macabro com o divino, o sombrio com o humor, o carnaval com o juízo final, o certo e o errado com os conceitos pessoais de fraqueza, concupiscência e desejo. É um tema polêmico, o enredo precisa ser muito bem contado. Mas com a força que a Academia do Samba tem, somado com a genialidade do Lage, tem tudo para ser uma obra clássica na Sapucaí. Esperar pra ver!!!

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